E era a hora do regresso
- Desafios da Escrita
- há 2 dias
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Comecei a namorar muito cedo. Apaixonei-me por ele à simples primeira vista. Era mais alto
do que eu, tinha uns cabelos escuros e lisos, um sorriso de dentes perfeitos, um pouco maroto
que era o encanto de qualquer rapariga.
Nunca me considerei alguém com uma vida amorosa ativa, quero dizer, tive aqueles
namoros banais de criança e gostei de 2 ou 3 rapazes, mas nunca foi nada por aí além.
Resumindo, porque a nossa história foi muito parecida à de muitos adolescentes, tínhamos
amigos em comum, rondávamos idades entre dezassete e vinte e um anos, tendo eu dezassete
e ele dezanove. Evidentemente, tornámo-nos mais próximos e ele começou a ser mais
amoroso comigo. Conclusão, começámos a namorar.
No início, ele era o meu rapaz de sonho, era atencioso, tínhamos encontros frequentes,
íamos comer gelados e ao cinema e dei- lhe a conhecer a minha família.
À medida que o tempo passou, começou a evidenciar sinais de ciúmes e até alguma
violência, que eu achava muito banal porque foi o meu primeiro amor.
Havia uma série de regras que tinha que seguir, caso contrário, havia sempre discussões
muito fortes as quais eu evitava ao máximo. Amava-o demasiado para não as seguir. Entre elas
estavam: não poderia sair de casa sem avisar; não podia ter amizade com nenhuma pessoa do
género masculino e as pessoas do género feminino tinham que ser aprovadas por ele; não
podia usar roupa reveladora; não podia usar maquilhagem.
Acho que já compreenderam aonde quero chegar. Na altura, trabalhava numa empresa e
um colega do género masculino, com o qual me relacionava muito bem, ofereceu-se para irmos
lanchar a uma padaria ao virar da esquina. Eu, inocentemente, aceitei. Quero só mencionar
que aceitei maioritariamente por educação e na empresa onde trabalhava era obrigatório usar
saia um pouco acima do joelho, camisa social e blazzer.
Eu, cumprindo as regras do meu amado, enviei-lhe uma mensagem a avisar o que iria fazer
quando saísse do trabalho. Porém, cometi o “erro” de dizer que ia com a minha melhor amiga,
pois sabia que, caso contrário, ele não me deixaria ir. Ele acedeu.
Assim foi. Fui com o rapaz, lembro-me de me sentir bem nesse momento, ele era muito
engraçado. Chegámos ao local e passados exatos nove minutos, vejo o meu namorado a
entrar na padaria. O meu corpo gelou. Eu sabia o que iria acontecer. Ele avisou-me.
Fiquei tão congelada, tão paralisada, tão em choque que a primeira coisa que me lembro foi de
ele me puxar pelo braço até ao carro e a última foi o pontapé que me deu na cabeça. Desmaiei.
Depois só me lembro de acordar no hospital e a minha mãe do meu lado. Ela questionava-se
o que me teria acontecido. Ele nunca mostrou estes sinais em público. Eu, com uma lágrima
escorrendo do olho, disse-lhe “Está na hora do meu regresso, mãe”.
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