Faísca...
- Desafios da Escrita
- 24 de abr. de 2024
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Faísca...
Era uma vez um lindo gato idoso chamado Faísca que vivia numa ilha gigante cheia de tanta beleza, vida e harmonia. Faísca tivera uma vida bastante difícil. Desde pequeno, foi abandonado na rua onde teve de ser obrigado a tomar conta de si, sem ninguém para o ajudar.
Os anos foram passando, e Faísca podia, muito bem, ter-se tornado num gato maldoso, com ódio, revoltado com a vida por tudo aquilo que lhe aconteceu. Durante cerca de dois anos, viveu de cidade em cidade, sempre à procura de uma nova oportunidade e de sustento. Viver da generosidade humana era um desafio diário, pois não era a comida e o conforto que vinham até ele, mas era ele que tinha de os procurar. Teve muitos obstáculos desde fome, doenças, gente maldosa, que o rodeava à espera do primeiro erro para o deitar, ainda mais, para baixo. Mas havia uma coisa de que ele se orgulhava, para além de não ter perdido a sua esperança de conseguir e merecer algo melhor, foi também o facto de ter ajudado outros animais nesta vida de rua. Viver na rua é duro, mas, ainda mais, para quem não está habituado a encarar uma realidade tão distinta daquela que aparece nos anúncios. Muitos que, infelizmente, vão parar a esta vida podem não conseguir sobreviver.
Faísca sentia que se pudesse fazer alguma coisa para poder salvar os outros animais, iria fazer. E assim aconteceu, muitas e muitas vezes, ele lá estava a dar apoio, força e esperança, o que, por vezes, é o que mais se precisa em momentos de aflição. Desde cães, gatos, aves, caracóis, joaninhas, tartarugas, lagartas, borboletas todo o tipo de animais. Não era fácil a vida que ele levava, mas sentia que as pequenas ações lhe davam força e aos outros, também. Faísca lembra-se de cada detalhe de todos os sacrifícios que teve de fazer, desde o torcer um pé para salvar uma pequena lagarta que estava no meio da estrada, até a luta em que se envolveu contra um bando de gatos rufias que maltratavam um dos seus grandes amigos, o gato Salvador. Sofreu muito nesse dia e ficou extremamente magoado, mas, ao menos, conseguiu impor-se e defender aquele que mais amava.
O herói desta história acredita que todos os obstáculos foram importantes para o seu crescimento e, se não fosse toda essa vida dura que teve, ele não seria o mesmo. Não daria valor às pequenas coisinhas, pois são elas que fazem a diferença.
Depois de tantos anos duma vida terrível, eis que apareceu uma luz. Foi num lindo dia de verão, o céu estava azul e brilhante como o mar, o sol cintilava fortemente e sentia-se um leve perfume no ar, quando, de repente, a vida de Faísca deu uma volta completa. Desde sempre, foi um gato meigo que adorava quando as crianças o vinham tocar e dar-lhe mimos e muito amor, coisa que sempre rareou a Faísca. A partir de certo dia, em que um rapaz veio com o seu pai, um homem alto e forte, e o meteram dentro de uma caixa para o levarem para casa, isso nunca mais lhe faltou. O rapaz, que à cerca de um ano o ia visitar todos os dias depois das aulas, a um velho barracão abandonado perto do centro da cidade, não descansou enquanto não o tirou da rua. Naquela hora, Faísca sentiu-se confuso, assustado, perdido, mas, ao mesmo tempo, feliz e com esperança. Fora uma vida tão dura, mas que, finalmente, o recompensava, dando-lhe aquilo que sempre desejara, um lar, onde permaneceu até ao fim.
Mesmo com a sua nova vida, nada mudou na sua rotina, continuou a fazer aquilo que tanto gostava e nunca nenhum dos seus amigos foi esquecido. Podia ter um novo lar, mas sabia que uma parte de si estava lá com todos aqueles animais, naquelas ruas intermináveis que durante invernos, verões, primaveras e outonos foram a sua casa.
A vida foi passando e a idade foi chegando, Faísca sentia que podia ter feito muito mais, mas a bondade e a generosidade nunca faltaram, pois até nos dias mais difíceis soube amar, ser feliz e aproveitar as coisas simples da vida, partilhando-as com os outros.
Francisco Barbosa
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