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O poder de uma amizade

  • Desafios da Escrita
  • 4 de out. de 2021
  • 5 min de leitura

Era uma vez, um pequeno gato, que morava na vila Baltazar, que andava à procura do seu grande amigo de infância, enquanto espreitava pela erva alta os novos animais que andavam a sair das suas tocas e a conhecer o novo mundo que a primavera trazia. Estava uma linda manhã, quando ainda as primeiras flores encontravam-se a desabrochar, os primeiros pássaros a chegar das suas longas migrações vindos de sul, as árvores verdes, redondas e brilhantes com o nascer dos primeiros raios solares, e ao longe as nuvens a irem embora depois de uma terrível tempestade.

O gato chamava-se Salvador. Era um gato que tinha como dona uma senhora velhinha, mas muito bondosa e carinhosa, que o tratava como um verdadeiro príncipe entre todos os gatos da aldeia. Tinha sempre a melhor comida, os melhores brinquedos e a melhor cama e nunca nada lhe faltava. A velhinha chamava-se Isabela e tinha uma linda neta de olhos azuis e cabelos loiros cor do sol, chamada Beatriz, que vinha todas as primaveras, juntamente com o seu pai, ver a avó e o Salvador, único companheiro de Isabela.

Salvador, para além de um gato de uma beleza maravilhosa, distinguia-se pela sua bela amizade com um caracol, Moisés. Esta bela amizade já vinha desde a chegada de Salvador à vila há cerca de 4 anos. Ano após ano, tinha vindo a crescer. No entanto, infelizmente, todos os gatos da aldeia faziam questão de gozar com Salvador por se relacionar com uma animal tão diferente da sua espécie, mas também por todas as coisas boas que a sua dona lhe proporcionava. Chegavam ao ponto de o humilhar à frente de todos, quando, na verdade, a única coisa que sentiam por Salvador era inveja por não ter uma casa, assim, tão boa ou uma amizade tão linda e verdadeira.

Os dois amigos passaram por tanto ao longo do tempo e aquilo que os unia era algo que não dava para explicar por palavras. Amavam-se de uma forma tão maravilhosa que não conseguiam viver um sem o outro. Todos dias, por volta das 15h, faziam questão de se encontrar junto à velha casa da árvore de Beatriz, ao lado da casa de Isabela. Ficavam horas e horas a se divertirem, a falarem, a rirem e a desabafarem todas as coisas que lhes vinham à cabeça.

Moisés não queria saber da opinião que os restantes amigos tinham da amizade com Salvador, sabia que lhe fazia muito bem e isso bastava-lhe para ser feliz. Por outro lado, apesar de os comentários que os restantes gatos da vila faziam dele e que o deixavam triste, aproveitava todo o tempo com Moisés para se distrair, ser feliz e livre, pois, afinal, não escolheu a vida que a sua bondosa dona lhe dava e, por isso, não tinha culpa de nada nem de se sentir mais triste quando o problema era dos outros e não seu.

Passados 5 dias depois do início da primavera, Beatriz veio visitar a sua avó, ver como esta estava e perguntar-lhe se precisava de algo. Estaria lá durante 3 semanas e depois voltaria para a sua casa na cidade grande, para continuar os seus estudos. Nesta visita, Beatriz percebeu que a avó, Isabela, não estava nada bem. O frio do terrível inverno tinha-a deixado doente, precisando de cuidados médicos e do conforto e companhia do resto da família.

Depois de muito pensar e de falar com o seu pai, que a acompanhou nesta visita, decidiu levar a avó para a sua casa, onde poderia acompanhar o seu estado de saúde com mais frequência.

Isabela não queria ter de deixar o seu lar, pois se fosse para a cidade grande, não tencionava voltar a viver na sua casa velhinha que a viu crescer. Mas a solidão que sentia e as dores que a velhice lhe trazia faziam-na mudar de ideias e aceitar a proposta da neta. Depois de muito pensar, e muito contrariada por abandonar a sua casinha, Isabela decidiu aceitar o convite da neta com a condição de vir todos os meses ver o estado da sua casa.

Salvador, como era óbvio, viria com ela para a cidade grande viver perto de si na casa da neta. Mas, e a amizade com seu amigo Moisés, como ficaria com esta dura despedida?

Salvador, quando soube da decisão da dona, ficou de rastos, pois não queria ter de abandonar o seu grande amigo que tanta falta lhe faria. Andou vários dias mal, chegou mesmo ao ponto de não aparecer, como combinado, ao encontro ao pé da velha casa da árvore. Moisés, passado alguns dias, começou a ficar preocupado até que, por fim, Salvador apareceu e contou-lhe a trágica notícia que estava a preocupá-lo há vários dias.

Moisés ficou muito triste com a notícia da partida de Salvador para a cidade grande que por amar muito o seu amigo não conseguia abandoná-lo, assim. Depois de muito lamentar e de muito chorar, decidiram tentar encontrar uma solução para este problema. Salvador sabia que viria todos os meses ver a casa juntamente com a sua dona, mas não seriam algumas horas que iriam matar as saudades que a distância provocaria. Assim como falta do conforto e serenidade da voz de Moisés que sentiria no seu dia a dia.

Andaram vários dias para cá e para lá a pensar numa possível resolução para o problema que tinham em mãos. E depois de muito pensar, Salvador decidiu que não iria abandonar o seu amigo por nada neste mundo visto que a sua amizade valia mais do que tudo. Tencionava, assim, fugir com Moisés para bem longe daquele meio tóxico em que viviam e ir para um lugar onde ninguém julgasse a sua linda amizade.

Moisés não queria que Salvador abdicasse da sua dona que também o amava, da sua cama, da sua comida, da sua vida em geral por causa de uma amizade e de uma distância que os separaria.

Salvador já estava decidido e da sua determinação não voltaria atrás. A amizade que os unia era bem mais intensa do que todos aqueles bens materiais e, por Moisés, todos os sacrifícios valiam a pena, pois não imaginava viver num mundo sem o seu fiel amigo. Desta forma, indo para longe, poderia ser feliz e livre sem maus olhos a julgá-lo. Ele não escolheu aquela vida e só queria poder encontrar o seu rumo com Moisés, mas bem longe daquela vila que lhe dava um ar tão triste por ser tão julgado apenas por ser feliz.

Depois disso e de muito insistir, o caracol aceitou e, três dias antes de Isabela partir, fugiu para bem longe à procura do seu caminho, com o seu grande e único companheiro que tanto amava, começando assim do zero.

Isabela ficou muito preocupada e triste com este desaparecimento do seu lindo gato amado, prolongando a sua estadia na vila por mais umas semanas para ver se Salvador aparecia. Porém, depois de muito esperar e procurar, este não apareceu nunca mais. Passado algum tempo e com a mudança, a dor que ela tanto sentia foi desaparecendo e o conforto que a família lhe dava acabou por abafar a solidão que sentia na sua velha casa.

Quanto a Salvador e Moisés, acabaram por encontrar a paz e tranquilidade que tanto precisavam ao longo do seu caminho incerto. Isso tornou-os ainda mais unidos, provando que quando se ama alguém não interessa o aspeto, mas o amor que se sente um pelo outro.


Francisco Barbosa – 11º 21 / 2020/21

 
 
 

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